Na última quinta-feira, dia 14 de agosto, o juiz Marco André Tavares Teixeira, respondendo pela 1ª Central das Garantias e Inquéritos da Comarca da Ilha de São Luís/MA, por meio de um despacho publicado naquela data, entendeu que os atos decisórios relacionados ao inquérito da Operação Dinheiro Sujo, que desarticulou uma organização criminosa acusada de realizar jogos de azar e lavar dinheiro na capital maranhense, deveriam ser vinculados à Vara Especial Colegiada dos Crimes Organizados.
A decisão revelada pelo blog do Isaías Rocha enfatiza de forma resumida que o Juízo não tinha competência para processar e julgar os casos em questão, sendo necessário aplicar a Lei Complementar nº 188/2017, que ao alterar o art. 9º, LXV, do Código de Organização Judiciária, excluiu da Central de Inquéritos o processamento de casos envolvendo organização criminosa. Com isso, os autos foram encaminhados ao juízo competente, o que pode anular todas as decisões anteriores.
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De modo geral, a decisão pegou a todos de surpresa. Porém, não havia nada de inesperado. Agora, o debate acerca da competência do juízo coloca em risco a validade de atos decisórios importantes, como o mandado de busca e apreensão executado em 30 de julho e a prisão preventiva da influenciadora digital Tainá Sousa decretada em 1º de agosto.
Árvore envenenada
O caso maranhense diverge do entendimento estabelecido na maioria das decisões judiciais em situações semelhantes. Em agosto de 2023, a juíza Placidina Pires, da Vara de Feitos Relativos a Organizações Criminosas, do Tribunal de Justiça de Goiás, revogou a prisão de investigados, cancelou o sequestro de bens e valores e anulou provas obtidas no âmbito de um inquérito policial sobre suposta prática de estelionato, organização criminosa e lavagem de capitais envolvendo duas empresas no interior do estado.
A magistrada entendeu, em sua decisão, que o ordenamento jurídico só permite a validação dos atos praticados por juízo incompetente quando este não dispunha de meios ou informações para identificar ou suscitar sua incompetência.
“Desse modo, com base na situação acima retratada, entendo que a decisão que autorizou as medidas cautelares nestes autos, assim como os elementos de provas obtidos por meio destas medidas estão eivados de nulidade absoluta, porquanto foram deferidas por Juízo absolutamente incompetente”, explicou a juíza.
Incompetência impõe anulação
O Superior Tribunal de Justiça (STJ) também possui precedentes que determinam a anulação de provas em investigações quando há incompetência do juiz. Em novembro de 2020, por exemplo, a 5ª Turma da Corte reconheceu a nulidade de operação de busca e apreensão determinada pela 6ª Vara Criminal de Brasília no âmbito da Operação Grabato, deflagrada para apurar supostas ilegalidades na contratação de serviços e equipamentos para o hospital de campanha montado no Estádio Nacional de Brasília durante a pandemia da Covid-19. Como consequência, o colegiado declarou inválidas as provas obtidas na diligência policial.
O Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios (TJ-DF) já havia declarado a incompetência da vara criminal para a análise do caso, tendo em vista que a investigação envolve valores do Fundo de Saúde do DF, que são repassados pela União ao governo local.
Entretanto, apesar de submeter os autos à Justiça Federal, o TJ-DF entendeu que não seria o caso de anular as provas obtidas nas investigações, já que a divisão da Justiça estaria relacionada apenas ao princípio da especialização. Assim, para o tribunal, caberia à Justiça Federal decidir se ratificaria ou não os atos praticados até então no processo.
Sem aparência
Relator do habeas corpus na 5ª Turma, o ministro Reynaldo Soares da Fonseca afirmou que a situação dos autos não envolve a aplicação da teoria do juízo aparente, segundo a qual é possível aproveitar os atos decisórios de autoridade judicial incompetente que, na época, era aparentemente competente para o caso.
“Nessa linha de intelecção, reafirmo ser manifesta a impossibilidade de falar em juízo aparente, porquanto de prévio conhecimento da autoridade judicial que os fatos investigados envolviam verbas da União”, declarou o ministro, acrescentando que, pelo mesmo motivo, não é possível deixar para a Justiça Federal a decisão sobre a ratificação dos atos anteriores.
Efeitos do erro no caso maranhense
Caso a Vara de Crimes Organizados assuma a competência da Operação Dinheiro Sujo, todas as determinações da Central, incluindo busca e apreensão e prisão preventiva, deverão ser anuladas, pois foram emitidas por autoridade judicial sem jurisdição. Se não, o Tribunal de Justiça será encarregado de resolver o conflito de competência.
O impasse afeta diretamente a situação dos indiciados, inclusive de Tainá Sousa que é a única que está detida preventivamente. Há um pedido pendente de análise desde 5 de agosto para revogar e relaxar a prisão preventiva. No entanto, a análise é impedida pela falta de clareza sobre a competência. Portanto, apesar de o inquérito já ter sido encerrado e não haver motivos atuais para a manutenção da custódia, a influenciadora continua detida.
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